O LUGAR DA ARTE: FIM DE UMA NARRATIVA?
Alexandra M. Lopes1
O espaço / lugar da arte: uma reflexão filosófica fora do “enquadramento”.
Segundo Arthur Danto, em sua obra “após o fim da arte” (2006), denominar determinado objeto como arte nem sempre fez parte de sua produção. O conceito apenas surgiu de fato na consciência geral no século XV, antes disso, a relação das pessoas com a obra de arte era bem diferente de quando finalmente o conceito surgiu e alguma coisa como considerações estéticas começaram a governar nossas relações com elas. As obras de arte, anteriormente, não eram apreciadas esteticamente, mas veneradas como imagens.
De uma forma geral, as discussões filosóficas tradicionais acerca da arte tiveram um propósito muito mais estético que de analisar a natureza da arte propriamente dita. Foram poucos filósofos que problematizaram com mais afinco sobre “o que é arte?”, que colocaram esta indagação como um problema. A maior parte dos tratados de estética visaram diferenciar arte de não arte, arte de realidade, enumerando critérios definidores responsáveis por tal distinção, assemelhando-se mais a compêndios sobre beleza e verdade identificando tais “características” com a natureza da arte e com a contemplação.
Desde Aristóteles até mais ou menos o século XIX, o critério incontroverso para definir uma obra de arte era o caráter mimético2: imitar uma realidade externa, real ou possível, o que consequentemente colocava o objeto de arte numa posição “superior” à vida sensível. Além disso, a maior parte dos tratados estéticos concentrou-se, seguindo as pegadas da mímese, em enumerar critérios definidores responsáveis pela distinção entre arte e não arte, arte e realidade, ao invés de trabalhar estas esferas em interseção. Ora, a definição de um imperativo estilístico (entende-se estilo como conjunto de propriedades compartilhadas em um conjunto de obra de arte, mas que também é utilizado para definir, filosoficamente, o que deve ser um trabalho de arte), possibilita a elaboração de um processo histórico linear, cujo espaço da arte é delimitado por características que estabelecem a distinção entre arte e vida sensível, arte e realidade, arte e não arte.
Todos os movimentos artísticos foram direcionados por esta percepção filosófica de uma “arte verdadeira”: que a arte é X e que tudo que não é X então não é arte (DANTO, 2006). Veja bem: Danto está problematizando o fato de identificar uma espécie de “essência da arte” com determinado estilo e considerar todas as demais formas de expressão artísticas como falsas. É como se considerássemos, por exemplo, que a verdadeira arte é abstrata e toda arte, em sua essência deve ser a mesma, isto é, abstrata. Isso significaria que toda a evolução artística, todo processo pelo qual o fazer artístico já percorreu, tratar-se ia de uma espécie de “melhoramento” da mesma coisa (da essência), sendo que qualquer movimento que se colocasse contra tal “evolução” deveria ser dizimado – principalmente pelos críticos de arte que, por sua vez, também são definidores do que “pode” e o que “não pode” ser dotado de valor artístico.
Podemos dizer que desde os primeiros intuitos em se criar uma narrativa histórica da arte, mais ou menos entre os séculos XV e XVI, (Danto elegeu Vasari, 1550, como o “marco” definidor destas narrativas) criou-se uma espécie de comprometimento em projetar uma história da arte que fornecesse um “enquadramento” – parafraseando Hans Belting (2006) – segundo o qual fosse possível predeterminar, avaliar o “lugar” da arte de acordo com cada um dos estilos. Mas tratava-se de uma história que necessitava ser inventada, ao passo que os elementos de sua narrativa – os objetos artísticos – já existiam definitivamente. Winckelman, já no séc. XVIII, quando escreveu a história da arte da antiguidade (1764), se propôs a realizar uma “tentativa de um edifício teórico” e extrair “a essência da arte” em sentido estrito, “das obras”, em vez de falar somente das “circunstâncias externas”. O apelo a um modo oficial e universal de narrativa tornou-se cada vez mais forte, em que se compreendia a arte como uma ideia encarnada nas obras, de acordo com um sentido inerente aos acontecimentos históricos: a arte era entendida como história, embora não possuísse a própria história. A maneira mais simples de falar sobre arte era segui-la na própria história em que havia se desenvolvido: tudo o que se tornava objeto de arte precisava ser explicado primeiro como obra de arte, sem considerar se em seu surgimento se pensara em arte (BELTING, 2006:181-184)
Segundo Hans Belting (2006), toda a criação artísitica se ajustou ao que denominou de “enquadramento” da história da arte tanto quanto esta se adequou a ela. Este “enquadramento” (que aparece com o surgimento da história da arte no século XIX) se trata de uma imagem fechada do cenário artístico, em que todo o fazer era cerceado pela decisão do que poderia ou não tornar-se arte; ao mesmo tempo em que também mantinha o observador numa posição passiva, à distância do objeto: como se a arte se mantivesse apenas “em si mesma” e não na vida: se enquadrava no museu, sendo contemplada como um “ideal”. (BELTING, 2006)
O mesmo aconteceu com a estética e com a teoria da arte. Numa cultura compartimentada como a nossa, distribuída e fragmentada em tantas especialidades, é revelado mais sobre a disciplina em que é a arte exercida do que a arte da qual trata; descrevem apenas uma história, mas nenhum projeto novo. Prefere-se muitas vezes discutir mais sobre as funções da arte do que sobre a própria arte; daí já se vê a experiência estética como um problema que necessita de esclarecimento, isto é, que perpassa pela necessidade de um entendimento (ISER, apud, BELTING, 2006). É a falta de autonomia, que aqui é lamentada quando a obra oscila entre a mera ideia de arte, por um lado, e um mero objeto com uma forma cotidiana, por outro. Se uma obra se transforma ela mesma em teoria ou se, inversamente, nega a fisionomia estética, que sempre isolou a arte do mundo das coisas, perde-se rapidamente o solo da teoria clássica sobre arte – embora não se torne totalmente independente dela.
A história da arte, como tradição, tornou-se hoje, não o símbolo, mas uma espécie de imagem negativa da atividade artística. O que não significa que a obra de arte perdeu o seu valor, mas que se encontra em contradição com a história tradicional, que não mais abrange todo o lugar que hoje a arte tem capacidade de ocupar. O fim da história da arte, neste sentido, não implica no fim da arte, mas registra o fato de que na arte, assim como na historia da arte, delineia-se o fim de uma tradição, que prezava pela existência de uma lógica interna que se descrevia a partir do estilo de época e de suas transformações. Veja bem: não se trata de um rompimento definitivo com a tradição, mas do não comprometimento com uma lógica determinante (seja um estilo ou uma categoria) que estabeleça o que é arte.
O fim da arte, no sentido de fim de uma narrativa da história da arte que sustente toda pluralidade e expressividade da qual hoje a arte se apropria, é concebível somente neste quadro de uma história interna, uma vez que fora do sistema não pode ser feito nenhum prognóstico, e portanto também não poderia falar-se de um fim. O fim da história da arte é o fim de uma narrativa, ou porque se transformou ou porque não há nada a narrar no sentido entendido até então (BELTING, 2006), ou seja: a arte não se prende à necessidade do registro histórico para ser arte, não se prende a um espaço linear do tempo. Hoje, poderíamos, ao invés de falar de uma perda do “enquadramento” – que por sua vez também dissolve a imagem, que antes era delimitada por este “enquadramento” – numa mudança ou variação do discurso, em virtude do próprio objeto artístico já não mais se encaixar nestes antigos enquadramentos. Trata-se do fim da regra do jogo, mas tomando como premissa que o jogo prosseguirá de outra maneira (BELTING, 2006): como diria Wittgenstein, “a mosca saiu da garrafa.” (WITTGENSTEIN, 2000)
Nesse sentido, após o “fim3” da arte, como Danto entendeu, demonstrou aos artistas a ausência da necessidade de aderirem a uma linha de criatividade única, podendo então assumir a multiplicidade e a pluralidade como identidade de obras que não se fecham num “enquadramento”. A ausência de uma narrativa histórica exclusiva abriu um imenso menu de escolhas artísticas e em sentido algum impede que um artista faça todas as escolhas que quiser: se não há regras, os artistas podem trabalhar da forma que quiserem, utilizando os imperativos que desejarem. Nesse sentido, temos um morto mas não temos um cadáver: pois não se trata da morte da arte: o que acaba é a sua historia como progresso para o novo (BELTING, 2006). Reivindicar que a arte chegou ao fim significa dizer que nenhuma arte é historicamente mais imperativa comparada com qualquer outra. Nenhuma arte é historicamente mais verdadeira do que outra, nem em especial mais falsa (BELTING, 2006, p.30).
A estrutura objetiva do mundo da arte revelou-se como sendo definida por um pluralismo radical, tanto no produzir arte como no modo pelo qual a sociedade em geral pensa a arte e lida com ela. Nesse sentido, quando Danto (2006) e Belting (2006) conceberam o que denominam como “fim”, não significa o esgotamento da prática artística (como defendia alguns teóricos radicais da década de 1980, alegando que a pintura moderna apresentava todos os sinais de esgotamento interno, ou limites demarcados para além do que não poderiam avançar). Se trata da ausência de uma unidade estilística ou categórica que, consequentemente, impossibilita um direcionamento narrativo e, de certa forma, também se trata de um tempo de “desordem informativa” – já que não se trata mais de um processo evolutivo linear, de um “melhoramento” e de uma liberdade estética: pois não há um enquadramento definidor. Ressaltemos aqui que a arte contemporânea não demarca oposição à arte do passado – como, por exemplo, a arte moderna se contrapõe à renascentista – não possui o sentimento de que o passado é algo do qual deve se libertar e nem mesmo o sentimento de que tudo deve ser completamente diferente. Ao contrário, é parte do que define a arte contemporânea a não existência deste “plano estranho” entre realidades artísticas distintas, nem são estas realidades tão distantes umas das outras. A arte contemporânea rompe com este critério a priori de que toda arte tem seu lugar – bem representado pelos e nos museus de arte – ao qual deveria se ajustar. (DANTO, 2006; BELTING, 2006)
Tratar do lugar da arte contemporânea como um problema, nesse sentido, direciona tanto aos estetas, pesquisadores – cujo trabalho é a análise e reflexão acerca do problema levantado – quanto aos artistas – cuja liberdade em fazer arte não mais segue as pegadas de um estilo que o enquadre na categoria de “arte contemporânea”. Entretanto, não se trata de uma via de sentidos contrários, já que o trabalho reflexivo dos estetas serve de suporte ao fazer artístico, mas não num sentido de estabelecer um estatuto que determine a diferença entre arte e não arte. Antes, se trata do desafio em reforçar o valor da arte a partir de suas possibilidades de expressão, sem, no entanto, vulgarizar-se. Pois, sabendo-se que não há uma distinção suficientemente perceptível entre uma obra de arte e algo que não é uma obra de arte, assume-se como problema explicar porque obras como a de Warhol são arte. (DANTO, 2006, p. 40-43)
A partir de então, o problema de definir o que é arte perpassa em conceber uma definição que seja compatível com toda e qualquer regra que compõe este novo jogo como algo que “deixou a tela” e passou a compor o mesmo lugar do “mundo real” – embora com certo distanciamento4. O que significa apreender não só a total liberdade do artista, como a inexistência de um direcionamento histórico que a arte deva assumir: é, como salientou Danto (2006, p. 45), um paradigma imprevisível, sendo antes a corporificação da liberdade e criatividade do artista. É “sair do museu” e ocupar seu lugar na vida sensível.
Nesta fase mais independente de uma narrativa histórica que hoje nos encontramos, existem incontáveis direções para a prática da arte, nenhuma delas privilegiada: o que coloca tanto a pintura – que foi um modo de expressão artística, de certa forma, predominante – quanto a instalação, a performance, a arte do corpo, o vídeo e tantas outras modalidades de técnicas mistas num mesmo patamar5. (DANTO, 2006:152-153)
Todavia, talvez a arte contemporânea se distinga de toda a arte feita desde 1400 pela razão de suas ambições principais não serem estéticas – o que Duchamp no início do século XX deixara bem claro com sua obra Fountain. Sejamos objetivos: ao apresentar, em 1917, um mictório como obra de arte, Duchamp salientou justamente a ausência de descritividade estética como atributo definidor, colocando em cheque uma avaliação meramente através de sua “boa” qualidade. Na mesma medida, o modo de relacionamento da arte com o público tomara outro rumo: seu modo principal de relacionamento não se destina a espectadores enquanto espectadores, mas a outros aspectos das pessoas a quem a arte se dirige, buscando um contato mais imediato com a sensibilidade de cada um que o próprio museu, como reduto da beleza, pode proporcionar: não há uma “barreira” que interdita o contato com a obra. Por isso, presenciamos uma tripla transformação: na criação da arte (pluralismo e desestruturalismo), nas instituições de arte (o museu deixa de ser o espaço principal de exposição de obras de arte), no público da arte (a arte não se destina mais à apreciação de uma comunidade exclusiva, elitizada, que “entende do assunto”). (BELTING, 2006, p. 204-205)
A arte contemporânea é por demais pluralista para ser apreendida apenas em uma dimensão estética (beleza, forma ou envolvimento do espectador), para se “enquadrar” apenas no museu (como até então o compreendemos). Os artistas hoje estão no final de uma história pautada por aquelas narrativas, que definiram a arte como sendo a conquista progressiva da aparência visual: o que aconteceu, segundo Danto (2006), foi uma revisão da ideia platônica de que a arte tinha que ser mimética: ao alcançar um novo nível de consciência, a produção artística torna-se independente de um discurso estético imperativo, que denomina “o que é arte” e o que qualifica esteticamente uma obra (Danto, 2006, p.40-43; 70-75; 149-150) – sendo que Fountain de Duchamp e as Brillo Box de Andy Warhol, declararam e demonstraram que a arte não possui uma aparência especial que deve ser assumida.
2- Resignificação do lugar da arte “fora” do enquadramento.
Devemos, neste segundo momento, considerar a questão proposta por outro viés. A ampliação do espaço da arte, assim como do uso de materiais, técnicas e formas de expressão que não se resumem apenas à pintura ou escultura, também implicam alguns entraves ao valor e significado da obra. Ressaltemos: não se trata aqui da defesa de uma linearidade histórica, tampouco de uma imposição estética que delimite “o que é” um objeto artístico. Aliás, como bem nos lembra Ferreira Gullar em seu texto, teoria do não objeto6, falar até mesmo de um objeto de arte material, no sentido explícito do termo, é complicado, já que os recursos e técnicas hoje utilizados pelos artistas não mais se limitam à apresentação de um objeto de arte, digamos, “definitivo” ou propriamente “material”: temos as performances, as instalações, a utilização do corpo, sendo todas formas de expressão artísticas que não são “permanentes”, como a pintura e a escultura o são – mas que nem por isso são “menos” artísticas.
A questão que aqui se apresenta talvez seja de significação. O artista também hoje participa da desterritorialização da arte ao questionar o conceito reconhecido de arte e ao libertar-la, tal como imagem, da moldura que a isolara do seu ambiente. A oposição entre arte e vida, dissolve-se hoje no momento em que as artes plásticas perdem os seus limites assegurados diante de outros meios e sistemas de compreensão simbólica7. Não precisa mais, necessariamente, se identificar com o mundo sensível para “falar” do mundo sensível – como se mantivesse uma identidade, paradoxalmente, não idêntica com o mundo.
Entretanto, quaisquer que sejam as posições, a verdade é que, quanto mais nos propomos a explorar, sem unilateralidades, as tendências das artes que estão sendo produzidas na atualidade, mais incertos nos tornamos em relação aos limites, aos gêneros, às identidades e às fontes legitimadoras da arte. Não há quaisquer materiais particulares que gozem do privilégio de serem reconhecidos como arte. Não há técnicas ou métodos de trabalho que possam garantir a aceitação do resultado final como arte (SANTAELLA, 2009) – o que a coloca sobre o risco de ser generalizada como algo “banal” ou “espetacular”.
Nesse sentido, podemos observar que o “problema” hoje enfrentado pela arte é um típico problema filosófico, porém, não é unilateral: pois não se reduz à especulação, análise e crítica filosófica sobre o tema, como também não se reduz a elencar as infinitas possibilidades das quais hoje o artista pode usufruir. Antes, a empreitada que hoje deve ser assumida é encarar o lugar da arte como problema que se compromete mais com a significação simbólica e sensibilização da obra: pensar a interseção entre arte / representação / vida, sem pretender distinguir arte de meros objetos reais através de um discurso estético embasado no determinismo do gosto. Se todos nós, sejamos artistas, ou estetas, ou não, “necessitamos” de uma “definição” de arte – embora, como diz Manuel de Barros (2000),” as coisas que não existem são mais bonitas” – que seja ao menos consistente com todas suas formas de expressão.
A reflexão que hoje o esteta deve assumir como alvo de suas investigações, por sua vez, não ausenta o artista de pensar sobre as mesmas questões. Afinal de contas, toda liberdade implica um poder de ação cujas consequências abarcam o peso da responsabilidade. Ou seja: resta ao artista saber apropriar-se das possibilidades que lhe são ofertadas, sem reduzir seu fazer artístico, por exemplo, a mero desejo de entretenimento do público. A obra de arte, por mais plural e diversificada que seja, não deixou de fazer referência ao seu próprio tempo a partir da provocação que tem poder de suscitar, perante outros domínios do saber e da interpretação. (BELTING, 2006, p. 172-173)
Referências:
BARROS, Manoel. Uma didática da Invenção. In: O livro das ignorãnças. 8.ed. Rio de Janeiro: Record, 2000.
BELTING, Hans. O fim da história da arte: uma revisão dez anos depois. Trad. Rodnei Nascimento. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
DANTO, Arthur C. Após o fim da arte: a arte contemporânea e os limites da história. Trad. Saulo Krieger. São Paulo, Odysseus, 2006.
GULLAR, Ferreira. Teoria do não-objeto. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/49439309/GULLAR-Ferreira-Teoria-do-nao-objeto?in_collection=3113590. Data de consulta: 30/08/2011.
SANTAELLA, Lúcia. O pluralismo pós utópico da arte. Revista Ars, n.14, ano 7. São Paulo, 2009. p. 130-151.
WITTGEINSTEIN, Ludwig. Investigações Filosóficas. Trad. José Carlos Bruni. Col. Os pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 2000.
1 Alexandra M. Lopes é fílósofa, professora de Filosofia no ensino médio e superior. Possui especialização em Temas Filosóficos (UFMG) e atualmente cursa o mestrado em Estética e Filosofia da Arte no programa de pós graduação da UFMG.
2 Esta ideia de arte como representação, isto é, como mímese, perdurou até meados do modernismo, no final do século XIX. A estética adotou a missão de conceituar a arte, estabelecendo critérios que a delimitasse, distinguindo-a das demais criações humanas. A arte desempenhava o papel exclusivo de criar imitações ilusórias da natureza, apoiando-se nas discussões filosóficas sobre o Belo e o gosto e como direcionam a produção artística.
3 Aparentemente, o que Danto está chamando de “fim da arte” é o fim de um discurso (ou narrativa, como ele mesmo diz) que direciona a evolução e a produção artística. O fim da arte jamais se apresentou sob a forma de um juízo crítico, mas no sentido de que o próprio conceito de história em que a arte se movia, desaparece do mundo da arte, perdendo a ideia de desenvolvimento e evolução progressivo. A arte, interpretada historicamente, chegara ao seu limite: ao alcançar um novo nível de consciência, a produção artística torna-se independente de um discurso estético imperativo, que denomina “o que é arte” (DANTO, 2006, p. 149-150).
4 Torna-se válido, hoje, a utilização dos mais diversos recursos, desde objetos industrializados, colagens, recursos tecnológicos até a pintura tradicional. A arte e as coisas reais não são mais distinguidas apenas por inspeção visual de um “olho treinado”, como Greenberg enunciou, mas ao mesmo tempo, precisa manter certa distância da realidade para não deixar de ser arte (DANTO, 2006, p.79-80).
5 Para Danto (2006), as possibilidades artísticas ilimitadas são frutos da reflexão filosófica da arte: perceber – e aceitar – que a obra de arte pode ser imaginada, ou produzida, sem a menor condição de assumir uma “aparência” de obra de arte. Por isso, nos valemos da “descoberta” de que não existe uma arte mais verdadeira do que outra, bem como não há uma forma exclusiva que a arte deva assumir – toda arte é indiferentemente arte. Isto significa que assumir a questão sobre o que a arte real e essencialmente é em contraposição ao que ela não é, é a forma errada de problematizá-la filosoficamente, já que a ausência ou presença de uma descritividade estética não pode mais constituir um atributo definidor da arte.
6 A Teoria do Não-Objeto é um texto que apareceu numa edição do Suplemento Dominical do Jornal do Brasil como contribuição à II Exposição Neoconcreta, realizada no salão do Palácio da Cultura, Estado da Guanabara, de 21 de novembro a 20 de dezembro de 1960.
7 Não há “oposição” entre arte e vida: mas apenas um distanciamento em que uma não necessariamente exclui a outra.